E longe
foi o agouro
No verão
passado, três dos jogadores que não serviam para o Real Madrid foram
convidados a ir-se embora e mandados para outras paragens. Os
holandeses Robben e Sneijder foram parar, respectivamente, ao Bayern de
Munique e ao Inter de Milão e bem os vimos, aos dois, no sábado, a
pisar o relvado do Estádio Santiago Bernabéu, jogando a final da Liga
dos Campeões, essa mesma final que o Real Madrid tanto queria jogar na
sua própria casa e a que não conseguiu aceder.
Sneijder, que
não servia para o Real, venceu ao serviço do Inter o campeonato de
Itália, a Taça de Itália e a Liga dos Campeões. Robben, que não
prestava para o Real, venceu pelo Bayern o campeonato da Alemanha, a
Taça da Alemanha e foi vice-campeão europeu. O terceiro jogador de que o
Real Madrid se desfez, no Verão passado, foi Javi Garcia que teve como
paragem o Estádio da Luz. Bendita a hora!
Javi García foi logo campeão em
Portugal e ainda venceu uma Taça da Liga. E entre os sectores
intelectuais do Benfica há quem o considere como o mais decisivo, o
mais influente dos jogadores que vieram contribuir para a brilhante
conquista do título nacional.
Ou seja, os dispensados do Real
Madrid fizeram a felicidade de outros emblemas, não menos históricos e
ambiciosos, enquanto os adeptos merengues se limitaram a contemplar o
brilho fantasioso das suas inúmeras estrelas sem nunca terem
contemplado o brilho concreto de nenhum troféu, de nenhuma tacazinha,
nem sequer de uma salva de prata. E é destes brilhos concretos que vive
o futebol e que sobrevive quem faz do futebol profissão ao mais alto
nível.
Como José Mourinho, naturalmente. Incrível
trabalho e merecida proeza de transformar um grupo de veteranos num
grupo de campeões europeus.
Enganou-se quem agoirou durante
seis anos que Mourinho nunca mais voltaria a ser campeão europeu.
Que engano
delicioso.
Em Toronto, no nada amigável jogo com o
Panathinaikos, Moreira terá feito o seu último jogo com a camisola do
Benfica e assinou uma exibição de alto nível, conta quem viu.
Por outro lado, conta quem viu a entrevista do
treinador do Benfica no programa televisivo Trio de Ataque, Quim não
estará nos planos de Jorge Jesus e já lhe terá sido sugerido que esteja
à vontade para procurar outro clube.
Aparentemente, conta quem
adivinha, o Benfica continua a procurar no mercado estrangeiro um
guarda-redes cujos méritos indiscutíveis lhe garantam a titularidade.
A baliza do
Benfica continua, portanto, a ser um tema em discussão, o que não é bom
nem para o Benfica nem para os seus guarda-redes.
No sábado
vimos em acção no palco de estrelas de Chamartín um dos guarda-redes
que não serviu para o Benfica, Hans-Jorg Butt, servir perfeitamente
para o Bayern de Munique ganhar o campeonato alemão e chegar à final da
Liga dos Campeões. E, de acordo com a imprensa do seu país, Butt é o
mais sério candidato a ser o guarda-redes titular da Alemanha no
próximo Mundial. Mas para o Benfica não serviu, o que dá que pensar.
É verdade que
Butt também teve a pouca sorte de chegar ao Benfica num momento em que
o Benfica não tinha sorte nenhuma, em que nada saía bem. Até parecia
bruxedo. O guarda-redes alemão, por exemplo, chegou à Luz com uma folha
de serviço impressionante e rara na sua posição. Ao serviço do
Hamburgo e do Bayern Leverkussen, Butt tinha marcado um total de 28
golos através de pontapés de grande penalidade, arte em que era
superiormente certeiro.
Camacho, que apostou em Quim para o campeonato,
confiou a Butt a baliza do Benfica para a Taça da Liga. Num desempate
com o Estrela da Amadora, bem no início da competição, Butt foi chamado
para converter um dos cinco pontapés e ele, que nunca falhara, falhou
ali mesmo, nem sequer conseguindo acertar com a bola na baliza.
Os adeptos
torceram o nariz e passaram a olhar para o alemão de soslaio. «Olha-me
este…» E, por tão pouca coisa, foi o fim de Butt no Benfica.
Este ano, para
o campeonato, Óscar Cardoso falhou quatro grandes penalidades, deixou
os benfiquistas à beira de quatro ataques de nervos, mas nunca terá
sentido sinais de desconfiança vindos das bancadas, onde se senta o
público, ou vindos do banco, onde raramente se senta o treinador, visto
que passa a maior parte do tempo em pé.
É precisamente isto que se tem de
fazer com o guarda-redes. Seja ele quem for.
Acabou
o campeonato e acabou-se a clubite. Agora os adeptos olham para a
Selecção como se fosse mesmo a tal «equipa de todos nós». Produzem-se
sensações curiosas. Depois do tristonho Portugal-Cabo Verde, nulo no
resultado e nulo no espectáculo, ouvi, pela primeira vez, alguns amigos
meus de outros clubes, rivais do meu, dizer com um ar plenamente
convencido: «Este Fábio Coentrão é mesmo muito bom jogador!»
Durante o
campeonato, nunca tinham dado por isso. É a cegueira clubista, de que
eles e nós, enfim, todos padecemos.
A Pior notícia do jogo com os
cabo-verdianos foi a lesão de Tiago que levanta dúvidas sobre as suas
capacidades de estar na África do Sul em pleno. Mas se Tiago, longe vá o
agouro, não chegar a embarcar, qual será o jogador que Carlos Queiroz
irá escolher para o substituir.
Ontem, ouvi um curioso diálogo de
café entre um benfiquista e um sportinguista versando, precisamente,
este tema:
- Cá para mim, levava o Rúben Amorim – dizia com
toda a convicção o benfiquista.
- Cá para mim, levava o João
Moutinho – ripostava com toda a convicção o sportinguista.
- O João
Moutinho? – escandalizou-se logo o benfiquista.
- Qual é o
problema? – foi a resposta que ouviu do sportinguista.
- Só se o
Queiroz quiser reeditar na África do Sul aquele triângulo de ouro do
meio campo do Sporting, Veloso, Pedro Mendes e Moutinho, que conseguiu
ficar a 28 pontos do campeão.
Pronto, a conversa azedou
imediatamente. É a cegueira clubista a triunfar sobre o espírito
patriótico.
A
entrevista de Hermínio Loureiro, presidente demissionário da Liga de
Clubes, ao semanário Sol é uma peça exemplar para quem, um dia, queira
escrever a História do último quarto de século do futebol português.
Loureiro, que conta muita coisa, diz, no entanto, que é «impublicável» o
teor do telefonema que recebeu de Pinto da Costa a anunciar-lhe a
decisão do Conselho de Justiça da FPF sobre a redução dos castigos a
Hulk e a Sapunaru.
E deve ter razão nas suas cautelas até porque, ao
longo da entrevista, limita-se a relatar factos – a rábula da entrega
da Taça é do mais elucidativo sobre a invenção de focos de conflito
(lamentavelmente, há quem chame a isto uma arte) - , sem precisar de
enveredar por acusações directas e sonantes. O mais longe que Hermínio
Loureiro foi, neste campo, ficou-se pela «falta de educação» evidente.
Quanto ao
teor do telefonema, quem sabe… talvez um dia… no YouTube.
Leonor Pinhão, 27 de Maio in Jornal A Bola